Raros são aqueles que se achando pessoas públicas indispensáveis às grandes molduras que vendo próxima a hora da travessia sem volta não queira, nem que o seja num gesto surpreendente e derradeiro, enxertar no caderno da história alguma versão que o torne notável.
Alguns, como Júlio César, desdenharam da prudência dos conselhos para que na manhã seguinte não fosse ao Senado. Então, muitos dos que julgava como sendo seus amigos e correligionários o cercaram à entrada, restando de tudo, entre aqueles punhais como se fossem de amor traído, apenas a surpresa maior e a menor frase – “até tu, Brutos?”.
Nas ultimas horas, quando o roteiro das estações do impeachment estava quase fechando, uns amigos da onça fizeram chegar aos ouvidos da Dilma, sim, ela agora ouve, que lhe faltava coragem para ir ao Senado.
Foi o bastante para que a valentona reincidente em desacatar general e ministros e vê-los sair humilhados do gabinete presidencial mordesse a isca. Admite até que digam que ter sido alçada à Presidência da República foi o maior erro do Lula – e o foi mesmo.
Na solidão das noites na cama no Alvorada, entre seus dois únicos confidentes, o lençol e o travesseiro, já consegue humildade para confessar que estava, e continua, totalmente despreparada para os deveres e desafios do cargo ao qual não teria chegado sem as mentiras que lhe mandaram dizer e as que em seu nome foram pregadas nas milionárias campanhas eleitorais, irrigadas, soube-se só muito depois, com a dinheirama desviada de empresas públicas e propinas de impatrióticos empreiteiros.
Ora, quem teve coragem para resvalar a realidade sócio-econômica do País ao fechamento de centenas de milhares de empresas causando uma onda de desemprego de mais de onze milhões de chefes de famílias; a quem não faltou coragem até para louvar os predicados mulher sapiens e, por conseguinte, as qualidades da mandioca, não será por medo do que lhe possam indagar o Renan, o Magno Malta, o Aloisio ou o Lewandowiski, que ela, Dilma, deixará de ir ao Senado e da tribuna ler a sua própria defesa após a descrição, um por um, dos seus crimes de responsabilidade.
É sempre bom lembrar. Quando houve a primeira grande manifestação popular nas ruas e praças das principais cidades do País, a Dilma ainda parecendo ser Presidente prometeu reforma politica. Na segunda rodada de protestos, ninguém quase lembra, acho que nem ela mesma, que passou a evitar a televisão, preferindo fugir dos panelaços através das redes sociais.
Quando a Câmara acolheu a petição do impeachment e o Senado instaurou o processo, afastando-a do cargo, ela se danou a falar que estava sendo vítima de um golpe.
Golpe sui generis esse que prescreve o afastamento provisório do Presidente enquanto dura o processo no Senado e, se comprovada a acusação de crime de responsabilidade, a perda definitiva do cargo, assumindo em seu lugar o Vice Presidente da República.
Está claro que esse mantra do golpe é a única forma que os conselheiros mais íntimos da Dilma, o seu lençol e o seu travesseiro, lhe incutiram como forma de fraudando a história dá-lhe alguma réstia de grandeza na condição de vítima. Uma falsa vítima. O que ela não sabe é que a história é ela mesma. É como a onda do mar que rejeita a salsugem das marés baratas.
(Edson Vidigal, advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal)
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