Se com quem contavas para o teu sonho, sumiu. Se com quem contavas para a tua amizade, decepcionou. Se por quem esperavas não chegou. Se a tua confiança se estiolou no entusiasmo com que, inocentemente, comprastes a mentira...
Se te exauriram a ponto de estares quase perdendo o que ainda te resta de boa fé, de esperanças, de otimismo, de boa vontade, corres a te encontrar com a solidão e trata logo de ir te entendendo com ela.
A solidão não é só um refugio para a purgação, esse intermezzo entre o que restou até aqui e o amanhã ou o logo mais e o inesperado trazendo uma surpresa ou surpreendentemente o menos desagradável.
A solidão é um espaço raro para quem lhe sabe o valor. Não é um tempo que se pega emprestado de alguém e depois devolve. Quando devolve.
Podes estar num elevador superlotado com pessoas conhecidas, e ainda assim estares só. A solidão independe de circundantes.
A solidão é a benção de um tempo sublime que deves aproveitar como se te fechasses para um balanço, é a tua contabilidade sob sigilo na qual irás até te surpreender quando concluíres que tivestes algum lucro qualificado em meio a tantas perdas irreparáveis.
Ora, quem não anda atrás da formula da boa forma física e da longevidade mentalmente sadia? Há quem prescreva o aprendizado à boa convivência com os próprios traumas, a identificar os fatores de estresse e logo evita-los, a ter alimentação sadia e exercícios físicos.
Nenhuma regra de boa forma funciona se a pessoa não amar. E amar não é um aprendizado definitivo, concluso como algo pronto e acabado. Amar é uma conquista de cada dia. É um sentimento que não se foca unicamente no ser amado. Precisa espraiar-se. Estender-se. Ampliar-se. Alcançar gentes, bichos, plantas, matas, aguas, espaços. A vida.
Gosto muito daquele acerto de contas entre o poeta e o magnata nos versos do Vinicius:
– Sabe você, o que é o amor? Não sabe, eu sei. Você já chorou de dor? Pois eu chorei. Sabe andar de madrugada tendo a amada pela mão? Sabe gostar, qual sabe nada... Você pode ser ladrão quanto quiser, mas não rouba o coração de uma mulher. Você não tem alegria, nunca teve uma paixão...
Quantos não estão por aí endinheirados e poderosos, se achando os caras, esnobando as musas e os poetas, mas sem perceberem que melhor fariam se, em paz com a solidão, mergulhassem em acertos de contas com as suas consciências.
Instado por essas coisas que tirando as alegrias dos homens acabam por torna-los inúteis, espertalhões ou otários, Rubem Braga receitou - a poesia é necessária. Para essas doenças do mundo o remédio ainda é o mesmo. Poesia. Conta Athenas os teus poetas! Conta.
É a solidão que inspira os poetas, convoca as boas novas das ideias novas, reajusta os sons, organiza as partituras, faz o acerto dos ensaios, encoraja a voz solta e independente nas estradas, belisca as almas chamando-as à humildade.
A solidão liberta. Estando a sós, longe bem longe desse estado de coisas e suas pessoas execráveis podemos pensar livres das más influencias externas e livremente empreendermos a jornada.
Nada de perder tempo com falsas utopias ou essas ilusões baratas que formigam por essas ladeiras e alguns sobrados.
Afinal, antes sós na união da nossa lealdade do que, na estrada, mal acompanhados.
(Por Edson Vidigal é advogado, ex-vereador de Caxias, ex-deputado federal, professor e ministro aposentado do STJ)
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